quarta-feira, 29 de abril de 2009

Um sei lá o quê

Não posso definir o meu estado de espírito quando me passaram como atividade de Língua Inglesa um certo estudo etnográfico de cumprimentos realizados na minha cidade. Ficar por aí ouvindo as conversas alheias para fazer um trabalho parece-me uma atividade de ensino fundamental misturada com o James Bond da fofoca. De qualquer forma, achando isso meio inútil ou não, meio útil ou menos ainda, não importa! O texto valia nota e aqui está o resultado:

O ato de cumprimentar alguém faz parte de diferentes culturas, varia de uma para outra e representa o desejo de estabelecer comunicação com o outro. Embora cumprimentar uma pessoa seja algo simples, entrar em contato alguém, mesmo formalmente, é sempre bastante expressivo.

A forma de se comportar e as expressões escolhidas podem revelar ou ser interpretadas como a intenção e a posição de quem fala em relação ao interlocutor. Essa forma escolhida para cumprimentar alguém pode ser entendida como “fórmulas prontas para iniciar ou interromper o contato” (FIORIN, 2002, p. 36).

Fiorin (idem, ibdem) explica que essas expressões têm função fática, ou seja, visam verificar a existência de contato para que seja iniciada uma conversa ou para manter um diálogo. Neste texto, entretanto, serão analisados somente cumprimentos e saudações realizados na cidade de Maceió. Para tanto, foram observadas três situações: uma ligação telefônica num ambiente ruidoso, a sala de espera de um consultório odontológico e algumas expressões usadas durante um trajeto de ônibus.

Na primeira situação, percebeu-se a constante necessidade de saber se o contato mantinha-se ativo ou não. A pessoa que realizava a chamada repetia diversas vezes expressões como certo, entendeu?, ok. Porém, o fato que mais chamou atenção foi a forma utilizada para iniciar a conversa:

- E aí?! Alô? Resolveu aquele problema?

A primeira expressão usada chama atenção por ser, na maior parte das vezes, verificada em conversações pessoais. O avanço tecnológico possibilita que a outra pessoa saiba quem está do outro da linha, por isso, tornam-se dispensável apresentações. Aquele que realizou a chamada, provavelmente, ligava para alguém conhecido, não precisou se identificar, certificou-se que o outro estava ouvindo simplesmente perguntando se algo novo havia acontecido ( E aí?). Talvez por não ouvir a resposta, ele tentou mais uma vez iniciar a comunicação (Alô?).

Na sala de espera, a situação observada foi o oposto da primeira. As saudações realizadas eram mais formais e continham menos mal entendidos, pois o contexto não variava muito. As pessoas que se apresentavam tinham consultas marcadas ou apareciam para resolver assuntos relacionados a isso. Em geral, as atendentes recebiam os pacientes da seguinte forma:

- Bom dia. O senhor tem consulta marcada ou veio para atendimento emergencial?

Nesta situação de cumprimento, além da expressão ser mais formal do que a usada pela pessoa do telefone celular, a funcionária do estabelecimento estabeleceu contato visual com seu interlocutor e sorria enquanto falava e passava as informações.

Nos dois casos descritos acima, o tom de voz revelou-se fundamental para a mensagem que se desejava passar. No primeiro, os ruídos do ambiente impediam a comunicação, portanto o homem precisava falar mais alto, mas manter o tom amigável, uma vez que não se tratava de uma discussão ao telefone. Na sala de espera, a voz da atendente era calma e gentil a fim de deixar as pessoas à vontade.

Dentro do ônibus, observaram-se mais tipos de cumprimentos. Como se tratava de horário de aula, o local estava cheio de pessoas que se conheciam e utilizavam os cumprimentos com o real intuito de iniciar e manter uma conversação por um tempo maior.

As expressões mais ouvidas foram: Oi (muitas vezes a palavra era alongada e acompanhada por dois beijos no rosto, quando eram mulheres), E aí, véi?, Beleza? (mais usadas por homens). As pessoas mais maduras usaram expressões mais comuns como: Tudo bem? Como vão as coisas?

Embora, inicialmente, as expressões observadas não tenham a mesma função daquelas usadas pelos Tuareg, que dependem disso para sobreviver no deserto, todas elas mostraram-se relevantes para o grupo que as utiliza. Cumprimentar o outro e estabelecer boas relações sociais revelam-se importantes, por exemplo, nos ambientes de trabalho e estudo.


Referências

BARROS, Diana Pessoa de. A comunicação humana. IN: FIORIN, José Luiz. Introdução à Lingüística I. São Paulo: Contexto, 2002.

FALCHETTI, Shani; DI LASCIO, Raphael Henrique Castanho. Como a modernização e a tecnologia influenciam nas relações humanas. Disponível em: http://www.psicologia.com.pt/artigos/ver_artigo_licenciatura.php?codigo=TL0002
Acesso: 17 de abril de 2009.

YOUSSOUF, Ibrahim Ag et al (ed). Greetings in the desert. In: MONAGHAN, Leila; GOODMAN, Jane E. A cultural approach to interpersonal communication: essential readings. Singapore: Blackwell Publishing, 2007.